As doenças fúngicas que envolvem o trato respiratório de cães podem ser divididas em: doenças da cavidade nasal, onde mais comumente há infecção por Aspergillus spp, embora Penicillium spp e Cryptococcus neoformans também têm sido mais raramente isolados, e doenças pulmonares (histoplasmose, blastomicose, coccidioidomicose e criptococose). Outros fungos considerados oportunistas também podem acometer cães e gatos, em menor frequência. Essa enfermidade pode ocorrer concomitantemente ou secundariamente a tumor ou corpo estranho nasal, embora a maioria dos cães com rinite fúngica apresente como etiologia de base alguma doença imunossupressora. Menos comumente, pode ser secundária a traumatismo nasal.
Outros diagnósticos diferenciais incluem extensão de doença dental, do palato e rinite alérgica, linfoplasmocitária ou bacteriana. ASPERGILOSE
Cães das raças dolicocefálicas (cabeça longa e estreita com focinho alongado) imunodeficientes são os mais predispostos a contrair Aspergilose.
O Aspergillus fumigatus é a espécie mais comumente encontrada em animais com envolvimento primário do trato respiratório, embora outras espécies do gênero Aspergillus já foram isoladas, como A. flavus, A. niger, A. nidulans, A. deflectus e A. terreus.
O diagnóstico definitivo da aspergilose é difícil e geralmente é realizado quando a doença já progrediu demasiadamente, dificultando o sucesso do tratamento. Muitas técnicas podem ser usadas para o diagnóstico da doença, embora um único teste geralmente não seja o suficiente para um diagnóstico definitivo. Diagnóstico
Aspergilose nasal:
• Visualização direta: Uma técnica simples é o uso de otoscópio com auxílio de luz forte nas narinas, porque o fungo destrói o tecido local abrindo um grande espaço, o que facilita a visualização da região. As colônias geralmente aparecem amarelas, brancas ou verde-claras. A destruição tecidual também facilita a introdução de um endoscópio para a realização de rinoscopia, que é o método mais sensível para a visualização direta. Embora a rinoscopia permita a visualização direta de colônias e verificação de tecidos com anormalidades, não detecta problemas como destruição do septo nasal e outras alterações ósseas.
• Exame histopatológico: biópsia guiada pelo endoscópio, seguida de exame histopatológico é uma boa forma de se visualizar as estruturas fúngicas. Esta técnica, além de confirmar a etiologia fúngica do processo, permite a visualização da reação granulomatosa característica. As colorações à base de prata são ideais na análise das hifas e estruturas reprodutivas do fungo.
• Cultura e identificação: fragmentos de tecidos podem ser cultivados em ágar Sabouraud dextrose acrescido de cloranfenicol. A identificação dos fungos é feita pelo tamanho e comprimento dos conidióforos, formato das vesículas, tamanho e forma das cadeias de conídios e outros critérios morfológicos.
• Diagnóstico por imagem: quando a visualização direta do fungo e das lesões não é possível, podem ser usados exames radiográficos e tomografia computadorizada. O uso de exames radiográficos se configura em uma boa técnica para auxiliar no diagnóstico da aspergilose nasal, pois permite a avaliação da radiopacidade dos ossos, visto que 80% dos cães apresentam aumento da radiotransparência, com eventual destruição óssea. A tomografia computadorizada é um método de diagnóstico por imagem superior ao exame radiográfico, pois através desta se obtêm parâmetros melhores do grau das lesões ósseas e da mucosa, avaliando o crânio em fatias, sem sobreposições. Uma vez que os seios frontais são estruturas repletas de ar, possibilitam um contraste entre o ar e os tecidos moles e ossos, facilitando a visualização das lesões por esses métodos de diagnóstico por imagem.
Aspergilose disseminada: • Exames hematológicos e bioquímicos: podem ser detectadas anormalidades no hemograma como neutrofilia, eosinofilia e/ou monocitose. Em testes bioquímicos, pode-se detectar aumento das proteínas totais e enzimas hepáticas (ALT, AST, FAL).
• Cultura e identificação: a partir de qualquer fragmento de órgão ou tecido lesado, e fluidos corpóreos, como sangue e urina, pode-se promover cultivo, isolamento e identificação das espécies de Aspergillus, na aspergilose disseminada; entretanto, muitas vezes o animal tem de ser submetido a procedimentos invasivos para obtenção das amostras clínicas.
• Exame histopatológico: a partir de biópsias, o exame histopatológico pode ser realizado, como descrito para a aspergilose nasal, possibilitando a confirmação. • Sorologia: o teste da contraimunoeletroforese (CIE) é o mais indicado.
• Diagnóstico por imagem: quando há pneumonia, na endoscopia pode ser observado sangue nos lobos craniais, e, na radiografia, enfisema pulmonar e massas fúngicas.
Anatomopatologia
Macroscopia
Geralmente encontra-se marcada destruição dos ossos turbinados (figura 1), com extensão para o tecido conjuntivo perorbital e destruição da placa cribiforme em casos severos.
As alterações macroscópicas incluem granulomas pálidos ou acinzentados em cavidade nasal, medindo de 2 a 20 mm, e podem apresentar-se disseminados por diversos órgãos.
Figura 1. Aspergilose afetando ossos turbinados. Canino. Fonte:http://ocw.tufts.edu/Content/72/imagegallery/1362314/1368463/1373583
Microscopia
Os conídios e hifas septadas fúngicas também podem ser encontrados nos fragmentos histológicos (figura 2). Outros achados incluem ulceração da mucosa e infiltrado celular composto por uma mistura de neutrófilos e macrófagos, sendo observadas também células gigantes e infiltrado linfoplasmocitário.
Figura 2. Corte histológico de biópsia de cavidade nasal demonstrando macroconídio de Aspergillusspp em forma de cabeça, muitos microconídios e hifas septadas (seta). HE. Canino. Fonte:https://www.researchgate.net/publication/229079994_Sinonasal_aspergillosis_in_dogs_A_review
BLASTOMICOSE
Blastomicose é uma doença granulomatosa crônica causada por um fungo, que é comumente encontrada em madeira em decomposição e solo. Os cães que são frequentemente expostos a ambientes onde existe o fungo estão em maior risco. O fungo prospera em ambientes úmidos, tais como margens, lagos e pântanos, onde o solo úmido sem luz direta do sol promove o crescimento do fungo. Também está presente em áreas que são ricos em matéria em decomposição, tais como áreas arborizadas, florestas, e fazendas.
Diagnóstico
A melhor maneira para diagnosticar é avaliar os linfonodos, o fluido drenado de lesões da pele e fazer lavado traqueal. O diagnóstico pode ser obtido através da citologia na maioria dos casos. A confirmação citológica pode alcança até 85% dos casos e as amostras devem ser coletadas a partir de linfonodos, secreções traqueobrônquicas, ossos, aspirados de agulha fina de pulmões e oculares, esfregaços por impressão de lesões cutâneas, amostras de urina e líquido cefalorraquidiano. O exame entre lâmina e lamínula do pus ou detritos celulares coletados da lesão e clareados com gota de hidróxido de potássio a 10%, após ligeiro aquecimento, permite diagnóstico rápido da micose. Em casos positivos, o B. dermatitidis aparece em forma de células esféricas, simples ou com brotamento, provida da chamada membrana de duplo contorno. A histopatologia também é um método confiável, além de cultura e testes sorológicos (imunodifusão em ágar-gel, CIE e ELISA - sensibilidade de 100% e especificidade de 97%). Anatomopatologia
Macroscopia As lesões pulmonares caracterizam-se por pneumonia granulomatosa multifocal a coalescente, geralmente com nódulos firmes (piogranulomatosos) dispersos pelos pulmões (figura 3).
Figura 3. Os pulmões apresentam-se mosqueados por pontos claros amarronzados e vermelho-escuros e contêm múltiplos granulomas dispersos por todo o órgão. Blastomyces dermatitidis. Fonte:https://www.askjpc.org/wsco/wsc_showcase2.php?id=762
Microscopia
As lesões podem ser encontradas em pulmões, pele, ossos, próstata, epidídimo, bexiga, cérebro, meninges e medula espinhal. Revela reação inflamatória granulomatosa a supurativa mista. Observam-se granulomas com numerosos macrófagos, células epitelioides, alguns neutrófilos, células gigantes multinucleadas e leveduras de paredes espessas, com 5 a 25 µm, melhores visualizadas quando os fragmentos são corados com reações de PAS ou prata metamina de Gomori.
COCCIDIOIDOMICOSE A coccidioidomicose é uma infecção fúngica sistêmica, rara, que acomete os animais e o homem. Há vários relatos de sua ocorrência em cães que habitam regiões endêmicas do sudoeste dos Estados Unidos. No Brasil, sua ocorrência tem sido descrita em pacientes humanos provenientes da região nordeste.
É uma doença primariamente pulmonar, mas a forma disseminada tem sido descrita, com envolvimento do sistema nervoso central, ossos, articulações, coração, olhos e do tecido cutâneo.
É causada pelo fungo dimórfico Coccidioides immitis, um fungo telúrico, encontrado em regiões áridas e semiáridas. Recentemente, a partir de estudos de filogenia molecular, demonstrou-se a existência de outra espécie do agente etiológico, que estava "escondida" junto ao C. immitis, sendo chamada de Coccidioides posadasii.
Diagnóstico Pelo pouco conhecimento da coccidioidomicose em nosso país, muitos casos dessa micose provavelmente são erroneamente diagnosticados como pneumonias inespecíficas, TB ou mesmo pneumoconiose e silicose.
A observação direta do microrganismo é o método principal de diagnóstico, através de citologia ou biopsia
Exame direto: O exame direto deve ser feito como rotina em qualquer material suspeito: secreções, líquido cefalorraquidiano, exsudato de lesões tegumentares, pus de abscesso, lavado brônquico, aspirado de lesões ósseas e de articulações, urina, aspirado de medula óssea e linfonodos, etc. A pesquisa é feita em preparados com solução de hidróxido de potássio a 10% para demonstrar os elementos parasitários característicos de C. immitis. A visualização de esférulas imaturas permite um diagnóstico presuntivo, mas esses elementos podem ser confundidos com outros agentes fúngicos, entretanto, o achado de esférulas maduras, repletas de endósporos, é patognomônico e definitivo para o diagnóstico (figura 4). Nos líquidos orgânicos, o exame deve ser realizado no sedimento de material centrifugado até 3 h após sua coleta. Além do exame a fresco com hidróxido de potássio, o material pode ser distendido em lâminas e corado pelo ácido periódico de Schiff (PAS) e por impregnação argêntea de Gomori-Grocott.
Figura 4. Exame microscópico preparado com hidróxido de potássio a 10%. (a) fase parasitária do fungo, representada por esférula repleta de endósporos. (b) forma parasitária de Coccidioides immitiscaracterizada por esférula repleta de endósporos em fragmento de biópsia pulmonar (impregnação argêntica).
Fonte:http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1806-37132009000900014
Anatomopatologia
Macroscopia
Observa-se pneumonia granulomatosa de aspecto miliar, com variação no tamanho dos nódulos (figura 5). Em pleura pode-se notar lesões variando de nodulares a supurativos ou mistos.
Figura 5. Pulmão não colapsado contendo múltiplos pequenos nódulos esbranquiçados (granulomas) coalescentes. Cocidioidomicose.
Fonte: http://www.cfsph.iastate.edu/DiseaseInfo/disease-images.php?name=coccidioidomycosis
Microscopia
Como lesão característica, observa-se granuloma com a parte central ocupada por um esporângio, por esporos ou, às vezes, por pequena massa de tecido necrosado. Ao redor destas formações há proliferação de células epitelioides em forma poliédrica, estrelada ou arredondada, frequentemente com prolongamentos citoplasmáticos. Entre estas células ou ao redor dos parasitas encontram-se neutrófilos.A estrutura parasitária bastante característica, mostra-se rodeada por tecido conjuntivo-vascular de neoformação quase sempre infiltrado por grande número de plasmócitos e linfócitos. Eventualmente o tecido conjuntivo periférico pode formar uma delicada cápsula envolvente (figura 6). Ainda, pode-se observar infiltração linfoplasmocitária difusa nos tecidos circunvizinhos e, ocasionalmente, confluência de nódulos.